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Um belo ponto de situação.

por Filipa, em 29.06.13
De repente acordei o dobro de mim. Não tinha em casa um único sapato, uma única sabrina, uma única chanata que fosse que me servisse. Tinha dois trambolhos no lugar de meus deliciosos pezinhos e esperta como sou, vi logo que algo não estava bem. A médica mediu-me a tensão, viu como estava inchada e zás!, repouso absoluto. Absoluto o caralho, pensei eu, mas só até começar a sentir um desconforto estranho (ahahahahahaha continuo a mesma brincalhona de sempre: "desconforto estranho"...) que mais tarde verificámos (sim, eu também verifiquei) serem contracções. Portanto, é mesmo repouso absoluto. Estou oficialmente de férias forçadas por mor deste puto estar a descurtir um molho das águas tépidas que o envolvem e o que ele quer mesmo é vir cá para fora foder-me a marmita.
O pai da criança já me fez saber, precisamente hoje que descobri que ele era médico, que foi do concerto que fui e que me diverti como há muito não me divertia. Um chapadão nas trombas resolveu logo a assunto que morreu ali, que eu não sou cá gaja de me ficar.
Tal pai, tal filho, só me azucrinam a cabeça com ideias de merda, para o que lhes havia de dar.
Entro nas finanças para tratar de uns assuntos chatos e vejo que está a abarrotar, gente por todo o lado  que gosta de cagar nas grávidas, não imagino porquê. Aliás, as pessoas no geral, curtem um molho cagar nas grávidas, alguém devia fazer um estudo acerca disto mesmo, tem que existir um motivo forte que nos escapa, para as pessoas virarem a cara quando vêem que uma gaja de esperanças se aproxima e gostávamos de saber qual, só para não ficarmos a pensar que o povo português é solidário é mas é o caralho. Mas não é disto que aqui se vai tratar. Como tenho tempo para dar e vender, decido esperar pela minha vez, deixando aquelas pessoas todas entregues à sua própria consciência, se é que ainda não a gastaram noutra coisa qualquer. Tinha cerca de trinta pessoas à minha frente e um funcionário a aviar aquilo tudo. Começo a ler uma revista e vez em quando olhava para o quadro da vez. Olho para o relógio e são 11h e pouco. Ao meio dia, olho para o pobre funcionário, que entretanto arregaçou mangas, que suava, coitado, e que de vez em quando, sem motivo aparente, desaparecia. Decerto ia tomar um red bull ou assim. Pobre criatura.
De repente, vejo cinco colegas seus, vindos sabe deus de onde, das trevas por certo e, Ossana nas alturas!!, começam a aviar a freguesia com um furor que jamais tinha visto numa repartição de finanças. Dava gosto, acreditem. Num ápice, a clientela começou a desaparecer e num tête-à-tête unilateral com o meu João, sugeri-lhe a função pública como uma boa perspectiva profissional e pedi-lhe que pensasse nisso com carinho que as coisas felizmente já não eram como já foram e estes senhores tão solícitos eram um exemplo disso mesmo. Estava nesta conversa quando fui chamada, em dois minutos resolveram-me o problema e saio das finanças, pela primeira vez, com um sorriso nos lábios.
Vi as horas e reparei que estávamos a entrar na hora de almoço destes senhores. Suspirei, abanei a cabeça e fiz uma festa na barriga.

Tão bom estar de esperanças

por Filipa, em 18.06.13
Para além de todas as maleitas a que uma pessoa está sujeita com esta brincadeira da gravidez, acabo de chegar do oftalmologista com a mais improvável de todas.

Uso lentes de contacto há uma catrefada de anos. Tantos que já fazem parte de mim, contudo, nunca as esqueço: se ando mais de 18h com elas, se adormeço com elas, se coço a vista e me cai uma e torno-a a pôr, assim, na descontra, se tenho comichão nojolhos derivado das alergias, se uso muita maquilhagem e na grande maioria das vezes, desadequada às minhas reais necessidades, faço-o com a absoluta consciência de que estou a ser inconsciente (se não vos matei com esta, então não sei como vos poderei matar), mas nunca senti o desconforto que vinha a sentir há já uns dias a esta parte. Mal punha as ditas, começava a sentir uma espécie de frio, seguido de um fodido ardor que me fez dar cabo de três caixas de lentes crente na ilusão de estarem com algum defeito. Maneiras que fui ao médico, que é indiano, mas tirando isso é uma excelente pessoa, que me disse que com os olhos e com as lentes estava tudo muito bem, as hormonas, derivado deste bonito estado em que me encontro, é que me tornaram incompatível com as minhas melhore amigas, as lentes de contacto. Ficámos de nos encontrar lá mais para a frente a ver se é definitivo ou se ainda há salvação.
Pá, não é que não ache que fique charmosíssima de óculos, cheia de carisma e savoir-faire e o caralho, mas foda-se, já chega, não? A seguir é o quê? Não me digam que é ter período por tempo indeterminado, a seguir ao miúdo nascer, que parto já esta merda toda!
Conforme aqui disse, sofri de um caso de forte desamor com a música aqui há uns tempos e pedi-lhe um tempo. Pá, precisava de espaço para poder avaliar a importância efectiva que ela tinha em mim, e lentamente estamos a refazer o nosso caso, que até então tinha sido de profundo amor e admiração. Já lá vão praticamente dois anos em que tentámos inúmeras vezes voltar, mas algo de incompatível não deixava a coisa evoluir. Percebo agora que a única incompatibilidade que existia, era a minha parvoíce extrema, diz que isto de sermos mãe nos dá uma lucidez do cacete e uma perspectiva fixe das cenas. Aliás, isto de ser mãe é uma excelente desculpa para tudo. E percebo-o uma vez que mantenho esta relação quase doentia praticamente desde o berço e nunca nos desiludimos, sempre mantivemos as melhores relações e sempre presentes na vida uma da outra, enquanto que uma gaja dá um pontapé num calhau e de lá saem dez gajos. Se forem casados, com filhos e com a mania que são muito correctos, uma pessoa até jura que descobriu uma nova espécie de cogumelos. Dizem. Que eu cá não sei de nada.
Chego agora à conclusão que não sou maluquinha, na realidade sou só melómana. Até a determinada altura ouvia e dizia que só ouvia rock, dizia que o resto não era música, que não sabia como conseguíeis ouvir o que considerava ser merda, como éreis intransigentes por não me dares razão quando demonstrava, com provas baris, que a minha música era A música, audível em qualquer situação e adaptável a qualquer estado anímico, como estava enganada, Senhor! E sou melómana não porque ache a palavra gira mas porque de facto, a paixão por tudo quanto seja música faz-me sentir viva. Como qualquer ser de bom gosto, deixo-me influenciar pela música. E o meu João também que ainda tão pequeno e já anda armado em parvo e enquanto que com rock só não se aventa daqui de dentro aí para fora porque não calha, com outro género musical, nem tchum. Nada. Não mexe. Não respira. Acho que nem deve mexer os olhinhos, fica só naquela a tentar perceber que merda a mãe inventou agora de fazer. O que vale é que está em muito boa altura de aprender que a vida não é só isto, que há mais, muito mais, para além do rock e eu preciso de saber com que música lhe vou acalmar as paneleirices de que os bébés padecem, e não estou a ver como isso será possível com Megadeth. Enfim, isto de ser mãe é muito complexo e os nove meses de preparação são insuficientes.
Dia 28 vou estar no Campo Pequeno para assistir ao concerto dos UB40 que é banda da minha infância/adolescência e cujas músicas ouvia em looping que eu sou pessoa para querer mais e mais desta vida.
O gajo não gosta que também é todo esquisitinho com estas merdas e gosta é de kizombas e funk, mas eu quero é que ele vá pastar. 
É o primeiro grande passo que dou na recuperação desta relação que um dia já foi perfeita. Desejem-me sorte e se por acaso forem e virem uma gaja toda gira, com ar apaixonado e confiante, tenham cuidado com a minha barriga porque senão ninguém cala o meu gajo e tenho mais dois concertos para ir antes de desovar, ok?
Sou uma criatura dada a coisas a coisas do cacete. Já aqui disse que ter uma memória assim mais ou menos, não é para mim. Acho muito giro e não sei quê, mas pá, não vale a pena. Sou daquele género de pessoa que anda sempre de agenda atras, cujos melhores amigos são os post it e se querem saber, até no espelho da casa de banho eles estão colados. Se vou às compras sem lista, o mais certo é termos que ir comer fora porque me vou esquecer do ingrediente principal, se preparo a marmita para levar para o trabalho, deixo-a algures pela casa, se não ponho alarme não tomo os medicamentos, se não informo o gajo esqueço-me das consultas, ando sempre com as mãos cheias de cruzes que desenho com caneta mas que depois não sei a que se referem, deixo as chaves na porta do carro e vou-me embora, sou das que fecha a porta e só depois se lembra que as chaves se calhar ficaram em casa, nunca sei os códigos dos cartões e sei lá eu o número do meu bilhete de identidade, nunca sei o nome de ninguém e datas então nem se fala. Quero acreditar que isto acontece porque o meu pequeno cérebro está no limite e então apaga merdas pouco importantes para dar lugar a informação realmente útil. Sempre fui assim e se fosse na conversa da minha mãe, desde os oito anos que tomava "comprimidos para a cabeça, porque tu, Filipa Maria, tens a cabeça pior que a minha" e nem as solhas que levei me fizeram ter melhor memória, nem sei como ela contava que isso acontecesse.
Mas de vez em quando o milagre dá-se e verifico que afinal posso respirar, sou uma pessoa normal, pelo menos nessas alturas. Basta-me sentir um cheiro para de repente, viver o que vivi na altura em que esse mesmo cheiro aconteceu, basta-me sentir o perfume que usei quando me casei com o pai do meu filho para sentir de novo borboletas na barriga, basta-me sentir o cheiro dele para sorrir, cheiro o quarto do meu puto e lembro-me do pânico que senti quando vi o resultado do teste. Também penso como vai ser bonito para este já pequeno leitão sair, mas ainda falta bué, se não me falta a memória. Vou na marginal e quando sinto o cheiro do mar, lembro-me que quando por ali parava mais, era feliz, mas de uma maneira que não queria voltar a ser, porque ninguém pode ser verdadeiramente feliz quando opta por se partilhar com quem não está para partilhas. Cheiro a comida da minha mãe e sinto-me protegida, sinto-me lá atras, quando um prato de batatas fritas me fazia a gaja mais feliz do mundo. Entro no carro e o cheiro lembra-me as muitas viagens que faço nele, a sensação de liberdade que sinto quando conduzo e como isso me relaxa. O meu gel de banho que cheira a noitadas solteiras, o meu shampoo que cheira a água do mar, o hidratante que cheira a amor.
Como o meu nariz é fantástico com toda esta sua memória fantástica que me faz reviver coisas fantásticas e não sei se repararam ou se estavam diatraidos, mas lá mais em cima disse : "(...) quando me casei com o pai do meu filho (...)". Lamento não vos ter informado mas esqueci-me...

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